tradutor

domingo, 15 de abril de 2012

Sasuki


Depois de um dia de longa caminhada cheguei a Sasuki, um pouco cansado e ainda um pouco afetado emocionalmente pelos fatos de Kochi.
Fui me acalmando aos poucos, especialmente com as belas paisagens.
Encontrei um lugar barato para passar a noite, sem internet, para variar.
Sai para perguntar por internet de graça na cidade e tentei a estrategia de pedir ajuda nos correios. Desta vez me indicaram ir na oficina de turismo.
E Lá fui eu. Detalhe: a placa da entrada do predio da oficina de turismo está em letra japonesa (kanji) então o pessoal dos correios fez um mapinha e escreveu o nome em japonês para que eu pudesse encontrar o local.
Isso acontece muito e mesmo assim nem sempre é fácil achar. Tem horas que o pessoal escreve na folha o nome do lugar que eudevo procurar em japonês com uma letra muito ruim. E letra ruim em japonês é de doer. Eu olho o papel escrito, olho para a placa e tem vezes que o papel escrito não tem muito a ver com a placa.
Finalmente cheguei na oficina de turismo e encontrei um pessoal muito legal. O problema foi que lá não tinha WI FI e me deixaram usar um computador deles. Só que ja eram quase 18:00 e estavam fechando. Então quase nem deu para fazer nada. Por outro lado, uma das pessoas do grupo, Matsuda san, me convidou para jantar na sua casa, onde conheci a família dele. Foi bem legal. Depois do jantar me levou de volta no hotel e vi que o tempo havia mudado e tinha começado a chover.
No dia seguinte amanheceu com muita chuva. E a previsão era de chuva para o dia todo. Eu tinha um trecho de quase 35 km e não me deu nenhuma vontade de ficar andando o dia todo na chuva. Perguntei na recepção do hotel se tinham um quarto para outro dia e não, estava cheio.
Fiquei na recepção do hotel com preguiça de encarar a estrada e tive uma surpresa. Toca o telefone e a senhora da recepção me chama porque tinha uma chamada para mim (??). Era Matsuda san, o cara da oficina de turismo que me ligou logo cedo no hotel para perguntar se estava tudo bem comigo, se precisava de uma ajuda. Falei que estava tudo bem e comentei que ia ficar mais um dia em Sasuki. Mas no hotel onde estava não tinha vaga. Então ele me disse para ficar no hotel e esperasse um pouco que ele ia tentar achar uma solução.
Menos de 30 min depois apareceu no hotel com o carro e me pegou até a oficina de turismo. E ele tinha conversado com um casal de amigos dele, da cidade, dois velhinhos, só que é um casal diferente (japonês com húngara), que ofereceram sua casa para eu passar a noite. Só no Japão mesmo para acontecer uma coisa dessas.
Como estava cedo, fiquei um pouco na oficina de turismo onde conheci um cara bem legal, Suzuki, instrutor de Kayak, que ja rodou bem o mundo e me contou que tem gente que ja deu a volta na ilha de Shikoku de kayak. Chegou a hora do almoço, a chuva continuava forte e o pessoal da oficina de turismo me convidou para almoçar num restaurante. Depois me levaram na casa da família Takezaki, onde conheci Kunio Takezaki, um engenheiro aposentado que ja rodou bastante pelo mundo trabalhando para uma empresa de fibra de vidro. E que morou um tempo em Budapest, capital de Hungria, depois da queda do comunismo, e onde conheceu sua mulher, Elizabeth. Foram muito gentis comigo. Nem me conheciam e me convidaram para ficar na casa uma noite!
Eles moram bem perto da praia e no final da tarde, como tinha parado a chuva, fomos dar uma caminhada e ele me deu uma aula sobre terremotos e tsunamis. E me explicou, sempre dando gargalhadas, que Sasuki é uma região muito perigosa para tsunamis. Mesmo no tsunami de março de 2011 teve um pequeno (ondas de quase 3m!) que atingiu Sasuki. Detalhe: o tsunami de março de 2011 aconteceu muito longe de aqui, no norte do Japão, e Shikoku é bem no sul. Deve haver quase 3.000 km de distancia.
Me contou que quando ele era pequeno, em 1946, teve um bem grande e me indicou até onde chegou a água. Pelo nivel que ele mostrou, deve ter sido muita água...
Nos anos 60 teve um terremoto muito grande no Chile, do outro lado do mundo, a mais de 10.000 km de distancia. As ondas formadas por esse terremoto atravesaram todo o Oceano Pacífico em pouco mais de 10 horas (ele me disse que as ondas podem alcançar velocidades de até 800 km/h!). E como naquela época a comunicação não era como agora, as ondas viajaram pelo Pacífico e pegaram a população de Sasuki totalmente de surpresa naquele dia. E morreu muita gente.
Depois, voltando na casa, me mostrou com desenhos como acontecem os terremotos e os tsunamis. Uma aula completa. E, sempre rindo, me advertiu que se acontecesse um terremoto durante a noite (pode acontecer a qualquer momento por aqui e não tem tecnologia para identificar com antecedencia) em que eu estava hospedado na casa deles, que era para ficar tranquilo, que a casa é muito segura. Eu tinha que esperar até terminar o terremoto e aí sim, colocar uma roupa rápido, pegar os documentos e sair correndo para um lugar alto. Porque o tsunami pode demorar poucos minutos para atingir Sasuki. Ok, está tudo claro, posso ir dormir tranquilo agora, pensei...
E , sempre dando gargalhadas, me mostrou o mapa de Shikoku com as áreas mais perigosas para tsunamis. Sempre dizendo: no terremoto, fica quieto e reza para Kobo Daishi te proteger, depois do terremoto, se você ainda estiver vivo, corre para lugar alto. Valeu, Takezaki san.
Além das aulas de terremotos e tsunamis, me mostrou o ideograma usado para escrever "ser humano". Eu não consigo escrever aqui mas é muito lindo. E mostra que o ser humano nunca pode sozinho, que sempre precisa do apoio de outros. Na manhã seguinte amanheceu um dia lindo, tomamos o café da manhã juntos e me despedi de meus novos amigos, que até poucas um dia antes eram dois desconhecidos...
Arigatou gozaimazu!


Um comentário:

  1. Vivência FANTÁSTICA.
    Que carinho deste casal.
    Pelo que você passou a convivência com a morte é no segundo a segundo.
    Se estiver vivo .... esta foi a frase mais sensacional que representa a entrega para o Aqui Agora.
    abraços

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